Depressão e microbiota intestinal, as bactérias podem auxiliar diagnósticos mais precisos?

Não é de hoje que se conhece o importante eixo intestino-microbiota-cérebro. Nos últimos anos, muitas pesquisas têm se debruçado sobre o tema para examinar a ligação entre alterações da composição da microbiota intestinal (MI) e problemas neuropsiquiátricos como depressão, ansiedade e autismo. A depressão afeta mais de 300 milhões de pessoas em todo o mundo, e as terapias atualmente disponíveis nem sempre são efetivas ou são acompanhadas por efeitos colaterais indesejáveis. Neste sentido, novas abordagens para o tratamento da doença têm sido investigadas.

Dois estudos recentes indicam a forte relação do papel da MI em depressão. Mas afinal, quais as vias metabólicas envolvidas neste fascinante cenário?

O sistema endocanabinóide parece ser uma das ligações entre depressão e MI. Assim indica um estudo com animais livre de germes, que receberam transplante de microbiota fecal (TMF) proveniente de animais saudáveis ou com depressão induzida por estresse crônico. Os autores observaram distúrbios do humor e redução da neurogênese hipocampal, nos animais que receberam transplante fecal de camundongos deprimidos.


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A riqueza e diversidade alfa (Chao1 e índices de diversidade) foram significativamente reduzidas nos grupos S e PS em comparação com controles. Em nível de filo, grupos S e PS tiveram percentual de Firmicutes significativamente reduzido em comparação aos controles.

A análise metabolômica dos animais transplantados e deprimidos indicou metabolismo alterado de ácidos graxos, caracterizado por déficits em precursores lipídicos de canabinóides endógenos. Isso resultou em comprometimento da atividade do sistema endocanabinóide do cérebro, que poderia ter induzido depressão.

Os autores promoveram aumento dos canabinóides endógenos, por meio de bloqueio farmacológico das enzimas que os degradam, ou por dieta, e verificaram redução de sintomas depressivos nos camundongos, o que sugere papel promissor para intervenções dietéticas ou uso de probióticos para controlar/combater os sintomas de depressão.

Em relação a massa muscular destes indivíduos, observou-se correlação positiva (p < 0,05) entre Roseburia e Eubacterium e índice de massa muscular esquelética apendicular (IMMEA), indicando que serem esses gêneros mais abundantes em indivíduos com maior massa muscular.

E os achados vão além de estudos experimentais, em pacientes com transtorno depressivo maior não tratado (TDM – n= 118) e controles saudáveis (CS – n=118), pesquisadores chineses e americanos identificaram diferenças de abundância em 47 espécies bacterianas e 50 metabólitos. Entre as bactérias, citadas pelos autores, 18 espécies de Bacteroides estavam enriquecidas em TDM enquanto e 29 espécies estavam reduzidas nesta população, principalmente as pertencentes aos gêneros Blautia, Eubacterium e Clostridium. Curiosamente não foi observada diferença em nível de riqueza e diversidade microbiana entre pacientes com TDM e CS. Uma coorte de 38 pacientes tratados com TDM vs. 38 CS foi utilizada para validar os achados. Esta, mostrou que 6 biomarcadores (2 bactérias, 2 fagos e 2 metabólitos) tornaram possível discriminar entre pacientes com TDM e CS em ambas as coortes com precisão de mais de 90%.
Em conjunto esses resultados preliminares sugerem que a composição da microbiota e sua diversidade funcional estão associadas à sarcopenia. Essas alterações na MI, podem impactar negativamente vias metabólicas relacionadas à produção de energia celular, processamento de proteínas e transporte de nutrientes, e indicar um metagenoma mais pró-inflamatório devido ao enriquecimento de LPS em pacientes sarcopênicos ou com risco para sarcopenia. Estudos futuros com amostras mais robustas são necessários para confirmar os mecanismos de participação da MI nessa hipótese.

Os pesquisadores mostraram ainda que os níveis de GABA fecal e seus metabólitos relevantes (N- acetilornitina, prolina, oxoprolina e glutationa) diminuíram em pacientes com TDM em relação ao CS. Esses achados sugerem que os níveis fecais de GABA em pacientes com TDM podem ser modulados por um conjunto de microrganismos intestinais, que, por sua vez, implicam no desenvolvimento da doença.

Essas descobertas fornecem novas direções para compreender a fisiopatologia de TDM, bem como podem auxiliar na realização de diagnósticos mais apurados e abrir novas possibilidades para o tratamento complementar de transtornos depressivos por meio do manejo da composição da microbiota intestinal e seus metabólitos.

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Referências:

• Chevalier G, Siopi E, Guenin-Macé L et al. Effect of gut microbiota on depressive-like behaviors in mice is mediated by the endocannabinoid system. Nat Commun. 2020 Dec 11;11(1):6363.

• Yang J, Zheng P, Li Y et al. Landscapes of bacterial and metabolic signatures and their interaction in major depressive disorders. Sci Adv. 2020 Dec 2;6(49):eaba8555.

Liu QF, Kim HM, Lim S, Chung MJ, Lim CY, Koo BS, Kang SS. Effect of probiotic administration on gut microbiota and depressive behaviors in mice. Daru. 2020 Jun;28(1):181-189.

• Lukić I, Getselter D, Ziv O, Oron O, Reuveni E, Koren O, Elliott E. Antidepressants affect gut microbiota and Ruminococcus flavefaciens is able to abolish their effects on depressive-like behavior. Transl Psychiatry. 2019 Apr 9;9(1):133.


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