Mais de 700 espécies bacterianas diferentes e uma variedade de outros microrganismos (archaea, fungos e vírus) colonizam a cavidade oral humana, compondo a microbiota oral. A microbiota oral contribui para a saúde humana, resposta imune, metabolismo de carcinógenos e digestão de nutrientes1.
A disbiose da microbiota oral está relacionada com a ocorrência de doenças bucais locais, como periodontite e cárie dentária e, potencialmente, com doenças sistêmicas, como câncer gastrointestinal e doença cardiovascular2.
A ingestão de álcool pode afetar a microbiota bucal por ocasionar efeitos citotóxicos diretos sobre as bactérias, por influenciar interações entre saliva e bactérias, e por fornecer etanol como substrato para o metabolismo bacteriano3,4.
Estudo transversal realizado com adultos norte-americanos avaliou a relação entre a ingestão de álcool e a microbiota oral. Os participantes (N = 1.044) foram categorizados como não-bebedores de álcool, bebedores moderados (> 0 e < 1 bebida / dia para mulheres e > 0 e < 2 bebidas / dia para homens) ou bebedores pesados (> 1 bebida / dia para mulheres, > 2 bebidas / dia para homens).
Amostras de lavagem oral foram coletadas após bochechos de 30 segundos com posterior eliminação e colheita em um tubo de ensaio. O sequenciamento genético foi realizado pela técnica 16S rRNA5.
Observou-se que níveis crescentes de consumo de álcool foram associados com menor abundância de Lactobacillales (LBS), ordem bacteriana importante para manutenção de pH saudável da cavidade oral e, portanto, importante para diminuir o crescimento de bactérias patogênicas associadas à cárie dental e doença periodontal.
Lactobacillus são conhecidos por metabolizar acetaldeído, um carcinógeno humano do grupo 1, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS)5. Mas, com quantidades de Lactobacillus reduzidas, podem ser encontrados níveis elevados de acetaldeído. Além disso, diversas bactérias patogênicas podem produzir acetaldeído a partir do etanol consumido.
O maior consumo de álcool se associou com a presença de bactérias potencialmente patogênicas e associadas à cárie dentária, doença periodontal, endocardite infecciosa e outras infecções humanas. Incluem-se Aggregatibacter, Actinomyces, Kingella, Leptotrichia, Cardiobacterium, Bacteroidales (G-2) e Prevotella5.
Assim, entre os diferentes malefícios que o consumo de álcool pode causar, devemos considerar também a alteração da microbiota oral com potencial depleção de bactérias comensais e aumento da colonização por bactérias patogênicas.
Estas mudanças podem trazer implicações para a saúde em nível sistêmico, e aumentar o risco de doenças crônicas. Sequenciar a microbiota oral, e entender as causas e impactos da disbiose pode levar a abordagens direcionadas para prevenção e tratamento de doenças.
Por: Beatriz Ferreira
Referências:
- Baker JL, Bor B, Agnello M, Shi W, He X. Ecology of the oral microbiome: beyond bacteria. Trends Microbiol. 2017;25(5):362–374.
- Wade WG. The oral microbiome in health and disease. Pharmacol Res. 2013;69(1):137–143.
- Ingram LO. Ethanol tolerance in bacteria. Crit Rev Biotechnol. 1990;9(4):305–319.
- Scannapieco FA. Saliva-bacterium interactions in oral microbial ecology. Crit Rev Oral Biol Med. 1994;5(3–4):203–248.
- Fan X, Peters BA, Jacobs EJ, et al. Drinking alcohol is associated with variation in the human oral microbiome in a large study of American adults. Microbiome. 2018;6(1):59.